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O caminho dos nossos medos

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Já que tanta gente elogiou meu último texto (obrigada, pessoal, do fundo do coração) resolvi escrever outro falando sobre algumas coisas que eu descobri ao longo desse caminho de auto-conhecimento.

É claro que eu não sou especialista, mas nos últimos anos de conversas com terapeutas, psiquiatras, outras pessoas com depressão e leituras de alguns livros, eu fui aprendendo muito sobre a minha mente. Eu acabei pegando peças da psicologia, da neurociência, da terapia cognitiva e até do budismo para montar um conceito muito particular sobre o funcionamento dos pensamentos e das emoções. Porque acredite, quando se trata de algo tão complexo como o cérebro e o pensamento humano, nenhuma teoria tem a resposta completa.

É assim que é na vida real
É assim que é na vida real

Bom, é o seguinte: todos nós pensamos por associações. Vemos a chuva pela janela, ligamos esta imagem a uma memória de estar debaixo da chuva, ligamos essa memória a uma sensação negativa, concluímos que é algo a ser evitado e pegamos o guarda chuva. Isso tudo em micro frações de segundo, tão instantâneo que você nem toma consciência do que está pensando. Imagine realmente diversas áreas do seu cérebro sendo ligadas em linha, o local que processa a imagem da chuva sendo ligado ao local da memória do banho de chuva, ao local das sensações negativas, etc.

Beleza. Isso é o processamento do seu cérebro, algo desenvolvido ao longo de milhares de anos. É por isso que sabemos qual é a sensação de estar na chuva mesmo estando secos dentro de casa. Evolução, baby.

E tem mais um truque do nosso cérebro, que nos ajudou a sobreviver fazendo as associações corretas. Quanto mais vezes uma associação é feita, mais fácil ela fica de ser repetida.  Imagine se, toda vez que o homem das cavernas visse um leão, o cérebro dele tivesse que repassar todas as experiências anteriores relacionadas com o felino até descobrir em qual confiar. Muito mais fácil ir na resposta mais usada. E é aí que algumas ligações se tornam tão estreitas que acabam se confundindo entre si. A relação entre chuva e molhado, por exemplo, já foi repetida tantas vezes para nós (pela experiência direta, pela observação e pelo que os outros falam) que é quase impossível dissociar um conceito do outro.

Isso tudo também acontece com os processos mais sutis. Temos o costume de associar um acontecimento ou uma ação a um determinado sentimento, como: “fui demitido, portanto fiquei triste”. Mas assim como no exemplo acima existem vários pensamentos conectados entre o “ver a chuva” e “pegar o guarda-chuva”, aqui também existem pensamentos hiper velozes que nossa consciência não percebe. Entre o “ser demitido” e o “ficar triste”, a pessoa pode ligar esse ato a uma sensação de derrota anterior, ou a um sentimento de incompetência. Na verdade não há uma associação direta entre “ser demitido” e “ficar triste”. Basta pensar que se a pessoa já tiver outro emprego melhor em vista e esteja querendo receber o dinheiro do acerto da saída, por exemplo, a reação pode inclusive ser de alegria.

Um, dois, três e já!
Um, dois, três e já!

Então, tudo o que acontece no mundo passa pela nossa mente. Se você for pensar, o ato de ser demitido, o ato de ouvir seu chefe produzir uma série de sons com a boca, que o seu tímpano capta e seu centro de linguagem decodifica como as sílabas “vo-cê-es-tá-de-mi-ti-do”, esses acontecimentos físicos, não têm nenhuma conotação boa ou ruim. São acontecimentos tão mecânicos como uma gota de chuva que é atraída pela gravidade e cai no chão. O caráter negativo ou positivo é agregado pelo seu cérebro, que usa o conjunto de memórias, associações e pensamentos que você tem armazenados.

E aí, meu filho, nessas horas ele roda o programa mais usado.

Então se você passou anos ativando e fortalecendo as ligação entre os pontos “trabalho” e “derrota”, na hora em que aparece uma sugestão de ligação entre esses dois conceitos, ela é quase instantânea. Quer dizer então que basta passar o dia inteiro repetindo o mantra “eu sou bem sucedido no meu trabalho”, que o problema vai estar resolvido?

Bom, na verdade as coisas são mais complexas do que isso. E é aí que entra a terapia cognitiva. Mas isso é assunto para outro post.

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Gostou do post? Leia mais sobre esse assunto:
Dois anos de retiro e um aprendizado
Pedofilia não é conto de fadas
Maquininha de transformação

De psiquiatras e tabus

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Olá, meu nome é Larissa e eu tenho depressão endógena. Eu tomo remédios controlados desde os 16 anos e vou no psiquiatra a cada dois meses.

Já ensaiei escrever este texto muitas vezes. Acabei apagando por medo de “me queimar”, não entre os meus amigos, mas principalmente entre os meus colegas de profissão. Já falei desta doença aqui no blog e fiz referências a “alguém muito querido” que sofre com isso. Já menti várias vezes no trabalho, quando indagada a qual médico eu ia (neurologista, para a enxaqueca, era a resposta padrão) e sobre para quê eu estava tomando remédio. E já fiquei em silêncio enquanto ouvia um colega de trabalho dizer que a moça que estava se candidatando ao mesmo cargo que eu era louca, porque “tomava remédios tarja preta e ia no psiquiatra”.

Se eu sinto a necessidade de me calar e esconder algo que deveria ser natural, é porque existe um tabu. E se existe um tabu, ele precisa ser discutido.

Então aqui estou eu, respirando fundo, com o exemplo de mim mesma.

Só o Mr. Newman me entende.
Só o Mr. Newman me entende.

Vamos lá. Existe uma grande confusão entre os conceitos de tristeza e depressão. A tristeza é uma reação normal a um acontecimento difícil. Foi demitido? É claro que é motivo para ficar pra baixo, a reação saudável é mesmo ficar chateado até conseguir retomar as rédeas da vida. Já a depressão que a maioria das pessoas conhece, chamada de depressão exógena, é quando essa tristeza por algo que aconteceu se prolonga por muito tempo. Acontece com gente que perdeu um ente querido e depois “não consegue mais retomar a vida”. Isso não é uma fraqueza ou “manha” da pessoa. Mulheres e homens têm diferentes formações emocionais e mentais. Qualquer um pode entrar numa espiral de depressão e precisar de ajuda para sair de lá, e esses episódios têm que ser levados muito a sério.

Já o problema que eu tenho é a chamada depressão endógena. “Endo”, em oposição a “exo” se refere a algo que vem de dentro. Isso significa que as causas das minhas quedas de humor são majoritariamente bioquímicas e determinadas por fatores genéticos. Os próprios médicos não sabem explicar exatamente o que acontece, já que o cérebro humano ainda é um mistério para a medicina. Mas a maioria parece concordar que o problema é relacionado à recepção dos neurotransmissores, como a serotonina e a dopamina (conhecidos por causarem sensação de bem-estar). Ainda há dúvidas se o problema é que existem poucos receptores dessas substâncias ou se eles não funcionam de maneira adequada. E não, não existem exames para medir isso.

Então a minha depressão não tem um “motivo”. O que geralmente é um problema, porque quando eu digo que não estou bem as pessoas costumam perguntar “o que aconteceu?” e não dá o pra dizer que “meus receptores de serotonina decidiram entrar em greve ontem à noite”. Para esclarecer, eu gosto muito de comparar a depressão endógena com o diabetes causado por herança genética. Ambos são causados por fatores internos, mas podem ser agravados ou amenizados por fatores externos. Por exemplo: um diabético pode adotar uma alimentação saudável e exercícios físicos e até chegar dispensar as aplicações de insulina. Algo semelhante acontece com quem tem depressão endógena, sendo que o melhor antídoto é a terapia, e acontecimentos impactantes ou mudanças bruscas também podem desencadear uma crise. Ambos os males são doenças crônicas que, se bem controladas, permitem que as pessoas levem vidas normais, mas que terão que ser vigiadas para o resto da vida.

Só que, diferentemente do diabetes, em que você pode medir seu índice glicêmico e avaliar a evolução da doença, não existem exames para medir o grau de depressão de uma pessoa. E é aí que mora o perigo. Eu fui diagnosticada muito cedo, aos 16 anos, principalmente pelo fato de a minha mãe ter uma versão bem grave dessa doença e sempre ter ficado de olho nos meus sintomas. E isso, como no diabetes, foi fundamental para que eu pudesse controlar a doença. Mas eu mesma não tinha nem ideia de que tinha alguma coisa errada comigo. Eu me sentia cansada o tempo todo, dormia muito e raramente tinha vontade de sair com meus amigos, mas achava que eu era assim mesmo. Me lembro de escrever no meu diário numa virada de ano: “podia ter um intervalo entre um ano e outro, em que eu não tivesse a obrigação de existir e pudesse descansar”. Eu me cansava de existir.

Sabe quando você descobre que acabou a nutella? Era assim todo dia.
Sabe quando você descobre que acabou a nutella? Era assim todo dia.

Com o tempo, com terapia e remédios adequados (hoje eu tomo um antidepressivo e um estabilizador de humor) eu consegui começar me erguer e partir para a vida, mas ainda tive várias crises que duraram meses, sempre com um intervalo de mais ou menos três anos entre elas. Minha última crise aconteceu no meio de 2012. Não creio que meus colegas de trabalho tenham reparado, porque felizmente sempre consegui cumprir minhas tarefas apesar da minha angústia. Hoje, o principal objetivo que eu, minha psiquiatra e minha terapeuta temos é evitar novas recaídas. Mas eu sempre tive uma dúvida: seria eu só mais uma adolescente enjoada? Seria a depressão nada mais do que parte da minha própria personalidade? Eu não sei. Hoje eu posso dizer que estou em um dos meus melhores momentos dos últimos anos, e tenho a sensação que os medicamentos que eu tomo me permitem que eu tenha disposição para ser eu mesma. Mais do que isso, tenho a sensação de que não existe nada que possa alterar quem eu fundamentalmente sou.

Ainda quero voltar depois ao assunto da depressão. Por agora digo que se você está passando por uma fase de tristeza profunda muito prolongada, seja por causa de uma situação difícil ou principalmente sem motivo nenhum, procure ajuda. Mais do que procurar ajuda, estude. Leia tudo o que puder sobre a depressão, aprenda tudo o que puder sobre o funcionamento do seu cérebro. Converse com quem foi diagnosticado com a doença, com médicos, terapeutas. E nunca, jamais, tome remédios psiquiátricos ou pare de tomá-los por conta própria.

Atualização – leia o segundo post da série aqui: O caminho dos nossos medos

A classe média e o SUS

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Estou fazendo um tratamento pro estômago que estava detonando a minha conta bancária. Era algo do naipe “uma caixa com 10 comprimidos por mais de R$ 100”. O médico receitava os antibióticos sem nem pensar em me oferecer opções mais baratas (tenho cara de rica?), eu ia na farmácia e era aquele rombo.

Até que me deu um estalo.

Fui no posto de saúde do lado da minha casa e peguei remédio para três meses. DE GRAÇA.Como é que eu não pensei nisso antes??
Por que a gente acha que o SUS é só para quem é “pé-rapado”? Saúde não é um dever do Estado para TODOS?Tenho a impressão de que o fato de a classe média ter medo de usar o SUS também é parte do problema.

ImagemLeia mais: O SUS que temos

Comunidade de Saúde

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Quando mudamos de cidade, uma das coisas que ficam para trás são seus contatos médicos. Aquele exame de rotina com o oculista que você frequenta desde criança, ou aquele médico que resolveu o problema da sua mãe e te ajuda quando você tem algo parecido, não existem mais. Mas, numa cidade totalmente estranha, como encontrar bons profissionais que atendam pelo seu convênio e não fiquem a 40 km da sua casa?
Quebrei a cabeça durante algum tempo e encontrei uma ferramenta super útil. É o site Help Saúde, que congrega médicos por especialidade, convênio e local. Se você gostar do atendimento, há um botão que permite recomendar o profissional. Pena que não dá para fazer comentários sobre os médicos e hospitais.

História dos Cosméticos

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Lembram do vídeo sobre a história das coisas?

Então, Anie Leonard lançou mais um. A História dos Cosméticos:

Da medicina e o que se põe pra dentro

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A ideia do blog não era ser tão pessoal, mas não tem como começar esse texto sem contar alguns fatos da minha vida. Então senta que lá vem história.

Há seis anos, quando estava viajando com duas amigas pelo nordeste, comecei a sentir uma dor de cabeça. Mas não uma dor qualquer, uma dor muito forte, que me impedia até de andar normalmente e sequer conversar. Com a dor vieram náuseas e vômitos e eu entrei em desespero. Era praticamente a primeira viagem que fazia sozinha e estava numa cidade totalmente desconhecida. Achei que fosse morrer. Fomos até um hospital, tomei analgésicos intravenais e chegamos à conclusão que tudo não passava de uma intoxicação alimentar.

Depois disso esqueci o assunto até que, no início de 2006, tive outro episódio semelhante. Estava no bar, com amigos. Fui pra casa, tomei analgésicos, dormi e a dor passou. Mas no mês seguinte senti a mesma coisa. E no outro, e no outro e assim tem sido há quatro anos.

Logo da primeira vez que fui no médico, uma neurologista, fui diagnosticada com exaqueca. Desde então já consultei com cinco médicos diferentes, fiz tomografias, eletroencefalogramas, sessões de acupuntura, tomei remédios como antidepressivos, controladores de pressão, antilabirínticos, anticonvulsivos e até uma injeção na base do crânio. Atualmente, as crises são quinzenais.

Colocando pra dentro

Eu devo ter ido a cerca de 20 consultas e, em NENHUMA delas, o profissional da saúde tratou sobre a minha alimentação. Todos os tratamentos (exceto a acumpultura, que foi iniciativa minha) eram feitos a base de remédios. As consultas seguiam um padrão:
“e então, como estão as dores?”
“continuam”
“então vou mudar seu remédio”.

De fato, a fé nos remédios é tão grande, que um médico chegou a dizer pra mim: “bom, se você não tem melhora com esse medicamento, então seu caso não tem solução”.

Quando a questão da alimentação era tratada, me perguntavam se eu sentia que determinado alimento desencadeava as crises. Mas senti que nunca fui tratada como uma pessoa, e sim como um laboratório de testes. Se esse medicamento não funciona, tentaremos com aquele, ou uma dose maior. Nunca procuraram saber como meu intestino funciona, e nem sequer o que eu acho que desencadeia as crises.

Alexandre Feldman diz: você é o que você come

Mudando tudo

Já tinha desistido de tratar minha enxaqueca, e passei simplesmente a conviver com o problema e me entregar à dor nos momentos de crise. Até que um dia minha mãe apareceu com um livro chamado: “Enxaqueca – Finalmente uma Saída“, de Alexandre Feldman. A princípio não dei muita importância, pois me remetia à auto-ajuda ou àqueles charlatões que oferecem fórmulas milagrosas. Mas um dia em que tive uma crise particularmente forte, comecei a ler.

E devorei o livro em dois dias.

O autor fala exatamente o que eu penso. Será que a medicina não santifica os medicamentos? Os remédios são realmente a única saída, a ponto de se dizer que se eles não funcionam, não há mais cura? A alimentação e o funcionamento do corpo devem ser ignorados ou mesmo deixados em segundo plano durante o tratamento? Não seria a alimentação o fator principal da saúde humana?

Me lembro sempre de um comercial nessas horas. A Suzana Vieira chega em casa e diz: “minha vida anda tão corrida, que meu remédio para dor de cabeça não me acompanha mais. Por isso eu mudei para tal remédio, mais eficaz”. Como assim??? Dor costuma ser uma sinal de que algo está errado!

O problema é que engolir uma pílula e esquecer a dor é muito mais fácil do que mudar todos os seus hábitos, principalmente os alimentares. Alexandre Feldman faz a mesma constatação, e propõe uma mudança radical: cortar todos os alimentos que conhecidamente aumentam as taxas de hormônios que disparam a enxaqueca.

E isso é bem complicado, dado que um dos maiores vilões já é bem conhecido de todos: o açúcar. No final das contas, o açúcar aumenta a atividade cerebral (quem já engoliu um balde de balas quando era criança sabe bem disso). Pra quem tem enxaqueca, isso é uma receita de crise, que nada mais é do que hiperatividade cerebral. O problema é que não basta cortar o açúcar, já que os carboidratos que ingerimos também se transformam nessa substância, em velocidades diferentes, dependendo do tipo de alimento.

A atuação dos hormônios é bem complexa, e no livro o autor vai até a pré-história para explicar porque parece que estão arrancando meu cérebro com um fórceps a cada 15 dias. Mas o final a proposta é essa: passar a prestar atenção em você de verdade. Pensar que glutamato monossódico e remédios talvez realmente não sejam a única ou melhor escolha. E, com dor ou sem dor, tentar pular fora dessa ciranda maluca na qual a medicina nos meteu.

Já comecei a mudar o que eu como, e espero em breve ter boas notícias.

Todos por um

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Juntos fica possível

Em Divinópolis, cidade do interior de Minas Gerais, no dia 7 de outubro, mais uma criança nascia no hospital São João de Deus. Era uma menina, que aos poucos revelou que não era como as outras. Yasmin nasceu com catarata congênita bilateral, um tipo raro de doença que pode deixá-la cega. Existe cura, que é uma cirurgia que custa de R$ 5.000,00 a R$ 8.000,00.

A quantia é impossível de ser paga pela mãe, que tenta desesperadamente marcar o procedimento via saúde pública. O pior é que o bebê tem que ser operado em até três meses, ou passará a vida no escuro.

Esse podia ser apenas mais um caso, daqueles que aparecem na TV. Mas dessa vez alguém decidiu ajudar. Alguns amigos de Belo Horizonte viram a notícia no jornal e decidiram arrecadar o dinheiro a tempo para Yasmin fazer a cirurgia. Montaram um blog, o Juntos Fica Possível e iniciaram uma vaquinha on-line.

Pra mostrar que a internet é só uma ferramenta. A diferença está em quem usa.